Apesar das especificações, a realidade é bem diferente. Segundo a chefe de Fiscalização de Obras da Secretaria Executiva Regional II, Cleide Guedes, a SER II nunca recebeu denúncias, mas as edificações que estiverem sendo construídas em desacordo, podem ser autuadas e multadas num valor que varia de R$ 44,44, no caso de pequenas reformas, até R$ 6.000,00, no caso de obras de grande porte, podendo inclusive ser solicitada a demolição do empreendimento.
O direito adquirido foi fruto de muita luta, mas ainda se coloca como apenas uma entre as determinações desrespeitadas em relação aos deficientes físicos. Um passeio rápido pelo shopping mais próximo e veremos que a determinação da lei está longe de ser devidamente cumprida. Quem nunca passou pela tentação de estacionar na única vaga disponível, a de estacionamento para deficientes? A prática, infelizmente, é comum. Isso quando essas vagas existem.
A esperteza, porém, pode sair caro. A portaria nº 363/2006 da Autarquia Municipal de Trânsito (AMC) estabelece que os veículos estacionados em local reservado para deficientes que não portarem adesivo de carro transportador de cadeirante estarão sujeitos a uma multa de R$ 55,00, com perda de pontos por infração leve. Os agentes de rua devem, ou pelo menos deveriam, fazer a fiscalização. Para denunciar o delito, qualquer cidadão pode ligar para a Central de Atendimento da AMC, pelo número 0800 851517, e solicitar uma viatura.
Para adquirir o adesivo basta levar comprovante de endereço, CPF, identidade e atestado médico. O portador de necessidade não precisa necessariamente ser proprietário do veículo, mas deve comprovar o seu uso.
A lei determina ainda que sejam reservadas vagas para cadeirantes na proporção mínima de 1 vaga para locais com até 25 vagas, 2 para 26 a 50, 3 para 51 a 75, 4 para 76 a 100, 5 para 101 a 150, 6 para 151 a 200, 7 para 201 a 300, e 7 para locais com capacidade acima de 300 vagas, sendo mais uma reservada para cada 100 outras vagas ou frações. Mas como isso ocorre no supermercado do seu bairro, ou de um shopping ou mesmo de um prédio público?
David Farias, que foi desenvolvendo a deficiência a partir dos 19 anos, parece não ter limitações para presidir a Associação dos Deficientes Físicos do Ceará . “A maior dificuldade de um deficiente é vencer a si mesmo, o seu ego, seu preconceito, depois disso ele enfrenta qualquer coisa”, ele diz. Na presidência, ele já luta há 15 anos pela conquista de alguns benefícios.
Ainda em 1996, a associação foi responsável pela inclusão de 46 deficientes físicos no mercado de trabalho Hoje, com cerca de 350 associados, implantou em 21 de setembro deste ano um projeto pioneiro de abrigo com capacidade para até 17 deficientes físicos moradores de rua. Esta iniciativa, no entanto, visa ao acolhimento de indivíduos em situação de vulnerabilidade até que eles possam ser reintegrados à família e à sociedade.
Na mesma data eles comemoraram o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, com um bolo de 21 metros em alusão ao período de luta pelo passe livre.
Dos muitos benefícios, a ADFC conseguiu a reserva de pelo menos 16 vagas para deficientes pela cidade. A estrutura, porém, muitas vezes não atende às necessidades. Além disso, dificilmente existe respeito por parte dos motoristas. A Zona Azul se coloca como outro concorrente à liberação de outros destinos.
Políticas Públicas
Algumas promessas de campanha da prefeita Luizianne foram relegadas ao esquecimento. Uma delas, o passe livre, é uma luta antiga da ADFC. A construção de um centro de apoio a deficientes físicos e o aumento da frota de ônibus adaptados também ficou para trás. Em Fortaleza circulam cerca de 1.800 ônibus, dos quais apenas 16 são adaptados, sendo que nem todos eles circulam diariamente.
“Tem tudo pra deficiente no papel, mas na prática...”
Segundo ele, “Tem tudo pra deficiente no papel, mas na prática...”. Ele se surpreende com a falta de visão de lojistas em não perceber os deficientes como também um nicho consumidor e acaba por desconsiderar as determinações da lei de acessibilidade.
Conscientização
David conta que certa vez foi para a Beira Mar e surpreendeu-se com a ocupação de todas as vagas destinadas para portadores de deficiência. A sua esposa encostou o carro no recuo e foi ligar para a AMC de um orelhão para solicitar uma viatura, enquanto David permanecia no carro com o cunhado. A espera durou mais de 1 hora. A surpresa, no entanto, chegou 15 dias depois: uma multa de R$ 125,00 por abandono de veículo em via e criação de fila dupla.
David parece colecionar episódios de desrespeito. Conta que já aconteceu de seu acompanhante descer a cadeira de rodas e o motorista do ônibus levá-lo embora, ou mesmo de negar sua subida por conta do horário de pico. Ele ressente-se em dizer que Fortaleza é hoje um dos piores lugares para um deficiente residir: “Em locais como Teresina, Recife, Pará, Brasília, São Paulo, etc., existem benefícios cumpridos como o passe livre, albergues para deficientes, ou um plano de atendimento médico preferencial.” Apesar das barreiras, David comemora os “passos dados”, com uma maior aquisição de respeito, e sua cadeira segue rumando na crença de uma transformação via educação.